terça-feira, 28 de outubro de 2008

Como tirar seu dinheiro da Crise, se você tiver algum...


Nos últimos tempos, emoções não têm faltado nos mercados financeiros. Os investidores tiveram de se acostumar a ver a bolsa alterar altas e baixas de mais de 15% - às vezes, na mesma semana. As baixas foram tão intensas que a Bovespa teve de acionar em quatro ocasiões o chamado circuit breaker - parada obrigatória de 30 minutos nas negociações depois de uma queda superior a 10%. Ao mesmo tempo, o dólar disparou - chegou a uma cotação de 2,4 reais — e os juros futuros oscilaram tanto que as negociações de títulos públicos no Tesouro Direto chegaram a ser suspensas. Num ambiente desses, como proteger o patrimônio? Para ajudar o investidor a tomar decisões em meio a uma das mais intensas crises da história, EXAME ouviu dezenas de especialistas de bancos, consultorias financeiras, corretoras e gestoras de recursos. Suas principais recomendações podem ser lidas nas páginas a seguir.

CÂMBIO 1
É hora de comprar dólares?
Só para quem terá despesas em dólares de hoje a até seis meses — está planejando uma viagem internacional ou um curso no exterior, por exemplo. Nesse caso, os especialistas recomendam comprar dólares aos poucos até a data em que irá utilizá-los ou aportar recursos, também de forma parcelada, num fundo cambial. Quem terá gastos em dólar apenas daqui a mais de seis meses pode esperar um pouco mais. Já o investidor que estiver pensando em comprar dólares ou aplicar num fundo cambial para tentar ganhar dinheiro com a alta da moeda americana pode se dar mal. “Os riscos são elevados demais”, diz Eduardo Castro, chefe de investimentos da gestora de recursos do banco Real. Além disso, a maioria dos economistas acredita que a cotação do dólar vai voltar a cair. “Os altos e baixos devem continuar nos próximos dias ou semanas, mas trabalhamos com um preço em torno de 2 reais para a moeda americana daqui a três ou seis meses”, diz Castro.

CÂMBIO 2
Vou viajar para o exterior: é melhor evitar gastos no cartão de crédito?
Sim, na medida do possível. O melhor é levar dinheiro ou, dependendo do país, traveller checks para pagar contas em moeda estrangeira. Isso evita surpresas na fatura do cartão se o dólar subir demais. Existem, no entanto, exceções. Quem for fazer viagens longas, de mais de um mês, ou comprar equipamentos eletrônicos deve se planejar para pagar algumas despesas com o cartão de crédito. “O bom senso diz que é perigoso andar por aí com milhares de dólares no bolso”, diz Fabio Colombo, administrador de investimentos. Além disso, é bom lembrar que, para viajar com mais de 10 000 reais em espécie, é preciso declarar o valor à Receita Federal.

CÂMBIO 3
A alta do dólar vai fazer a inflação e os juros subirem?
É pouco provável. É verdade que a alta do dólar costuma elevar os preços dos produtos importados e pressionar a inflação. Num cenário como o atual, porém, espera-se que a economia brasileira desacelere um pouco, o que limita o risco de alta inflacionária. “Haverá maior dificuldade em repassar a desvalorização do real para os preços”, diz Alkimar Moura, ex-diretor do Banco Central e professor da Fundação Getulio Vargas de São Paulo. Na opinião de diversos economistas, a inflação deve perder fôlego mesmo no caso de produtos sem componentes importados, também em razão do menor crescimento do PIB. Nesse cenário, o atual ciclo de aumentos de juros estaria com os dias contados. Não é necessário, portanto, fazer investimentos para se proteger da alta da inflação.

BOLSA 1
É o momento de sair da bolsa?
Não. Para os especialistas, quem sair agora tem mais a perder do que a ganhar. Isso vale tanto para aqueles que compraram ações há mais de dois anos e o saldo de seus investimentos ainda está no azul como para aqueles que viram parte de seu patrimônio virar pó. “A bolsa pode cair mais? Pode. Mas a maior parte da desvalorização já ocorreu e, por isso, hoje, a chance de melhorar é maior”, diz Marcelo Mello, vice-presidente da SulAmérica Investimentos. Vale a pena, porém, fazer ajustes na carteira de ações. Os analistas recomendam se concentrar em empresas de grande porte e com poucas dívidas e vender papéis de empresas endividadas e que dependem de grandes volumes de financiamento para crescer.

BOLSA 2
Com a crise, descobri que corro mais riscos em meus investimentos do que gostaria. O que devo fazer?
Deixar seu portfólio mais conservador. Mas não é preciso vender ações ou sair de fundos de alto risco para fazer isso. O conselho dos especialistas é mudar a estratégia de aplicação dos novos recursos que serão investidos nos próximos meses. Eles recomendam aplicar mais em fundos DI e CDBs para reduzir o risco total do portfólio.

BOLSA 3
Decidi vender minhas ações. Qual é a melhor forma de fazer isso?
Quem já decidiu sair da bolsa precisa tomar alguns cuidados para não errar a mão. Uma boa opção é vender suas ações aos poucos, de preferência num dia em que os preços estejam em alta. Outra forma — que é mais arriscada, mas vem se tornando cada vez mais popular no mercado — é a chamada venda coberta de ações. Essa operação, feita pelas corretoras, funciona assim: o investidor acerta hoje uma data e um preço pelo qual poderá vender suas ações no futuro (geralmente, em até um mês) e recebe um prêmio que varia de 10% a 13% do valor acertado para a venda do papel. Esse prêmio, pago por quem está interessado em comprar a ação no futuro, é a grande vantagem desse tipo de venda. “O investidor garante um rendimento interessante, aconteça o que acontecer na bolsa”, diz Ricardo Zeno, da consultoria AZ Investimentos. O problema é que, se o preço da ação cair para um patamar inferior ao acertado, o negócio é cancelado. “Ninguém vai pagar mais para comprar uma ação que custa menos no mercado”, diz.

BOLSA 4
Vou precisar do dinheiro que está na bolsa em seis meses. Devo sacar agora? Não. Segundo os especialistas, há duas maneiras de programar a saída da bolsa — e elas variam de acordo com o perfil do investidor. Quem é conservador deve vender suas ações aos poucos até a data em que o dinheiro será utilizado. Já os mais agressivos não devem vender nada por enquanto. “É provável que, daqui a alguns meses, a bolsa esteja um pouco mais valorizada, e quem esperar terá chance de fazer um negócio melhor”, diz Marcelo Mello, da SulAmérica Investimentos.


ESTRATÉGIA
Onde devo investir meu 13o salário ou algum dinheiro inesperado que venha a receber?
A maior parte deve ir para aplicações conservadoras de renda fixa: fundos DI e CDBs de grandes bancos. Isso vale tanto para quem é conservador como para quem tem um perfil mais arrojado. A diferença é que investidores dispostos a correr algum risco — e a deixar seu dinheiro aplicado por, no mínimo, um ano — podem destinar cerca de 15% desses recursos para a bolsa. Os especialistas recomendam comprar ações ou investir em fundos que comprem papéis de empresas de grande porte e pouco endividadas. Fundos de renda fixa prefixados são uma boa opção para poupadores de qualquer perfil que pretendam aplicar por mais de um ano, já que a tendência é que os juros caiam.


IMÓVEIS
É o momento de aplicar em imóveis como investimento?
Não. Com o agravamento da crise financeira, surgiram muitas dúvidas a respeito das previsões otimistas sobre o futuro do setor imobiliário no Brasil. Mesmo que se valorizem, imóveis têm pouca liquidez. Quando o investidor precisar vender, talvez não encontre um comprador disposto a pagar o que o imóvel vale. Tirar dinheiro de uma aplicação para investir em imóveis também traz riscos. “Se o seu dinheiro está na renda fixa, tem boa perspectiva de retorno. Caso esteja em ações, não é hora de mexer e ficar no prejuízo”, diz Caio Torralvo, professor de finanças da Fundação Instituto de Administração, de São Paulo.

FUNDOS 1
Meu fundo multimercado está caindo mais que a bolsa. Devo resgatar?
Depende das características do fundo. É melhor resgatar se ele for alavancado — ou seja, se realiza operações nos mercados futuros que podem fazer os cotistas perder mais do que aplicaram. Mas atenção: nem todos os fundos classificados como alavancados têm, de fato, esse perfil. Eles podem ser autorizados a alavancar, mas não a fazer isso na prática. É preciso analisar a carteira do fundo para saber como são seus investimentos. Já os multimercados não alavancados são uma alternativa de diversificação. Mas é bom saber que, quando a bolsa sobe, esses produtos geralmente rendem menos que fundos de ações. “Quem acredita na recuperação da bolsa e pode investir por prazos longos deve sair dos multimercados e ir para os fundos de ações”, diz Marcelo Pereira, sócio da consultoria Tag Investimentos.

FUNDOS 2
Os fundos de capital protegido são uma boa maneira de enfrentar a crise?
Sim. Eles são recomendados a quem não tem estômago para agüentar as quedas da bolsa, mas não quer ficar de fora de uma eventual recuperação dos mercados. Esses fundos garantem ao investidor o resgate do dinheiro aplicado sem perdas mesmo quando a bolsa vai mal. Antes de aplicar num produto desses, porém, é bom saber que não existe mágica. Quando o preço das ações sobe, o investidor não recebe toda a alta. Ou seja, a proteção tem um “custo”: um retorno menor no caso de a bolsa se recuperar.


CONSUMO
Preciso fazer uma dívida elevada para comprar algo de grande valor. É melhor esperar mais um pouco?
Depende. Se esse bem for um imóvel para morar, o melhor é comprar já. “As taxas de juro dos financiamentos imobiliários ainda não subiram, mas podem subir com a crise”, diz Eduardo Jurcevic, superintendente de investimentos do banco Real. Nos demais casos, porém, quem puder deve esperar um pouco mais antes de se endividar. “Tempos de crise trazem falta de crédito e alta dos juros. Meu conselho é deixar as coisas se estabilizarem e aí sim contrair a dívida. Com certeza, as condições de financiamento serão melhores que as atuais”, diz Júlio Martins, diretor da gestora de recursos Prosper.